quarta-feira, 21 de agosto de 2013

NÓS SOMOS O OUTRO



Nós somos o outro

Não somos crianças inocentes vitimadas por um grande mundo malvado. Se nosso mundo é grande e mau, nós o fizemos dessa maneira. Isso é o que o Buda ensinou. O “outro” é um bicho-papão infantil, a projeção de nossos próprios medos em um objeto assustador de nossa imaginação, que nos aterroriza. Nossa ignorância é não ver que nós somos o outro. Não podemos nos permitir confundir inocência com essa ignorância.

A violência não é um objeto permanente, imutável e fixo. É um estado da mente, uma expressão da ignorância. Não tem mais solidez que uma nuvem. Não podemos lançar um ataque frontal na violência. Mesmo proteger a nós mesmos disso abastece sua existência de bicho-papão. Mas o Buda ensinou que podemos mudar.

Essa foi sua boa notícia: existe uma maneira de aliviar o sofrimento através da libertação de nossas mentes da cobiça, raiva e ignorância. Mas até que entendamos os modos como somos Oklahoma City, as bombas e os filhotes de ursos, as vítimas e os violadores, continuaremos a acusar os “outros”, sempre proclamando nossa inocência e fugindo de nossas responsabilidades.

Helen Tworkov, em “Tricycle: The Buddhist Review, Vol. V”
Tricycle’s Daily Dharma, 27 de setembro, 2007.

Tolerância e paciência

A fonte verdadeira de meu sofrimento é o auto-centramento: meu carro, minhas posses, meu bem-estar. Sem o auto-centramento, o sofrimento não surgiria. O que aconteceria no lugar disso?

É importante imaginar isso de modo completo e focar em seus próprios exemplos. Pense em algum infortúnio que te dá vontade de explodir, que faz surgir a raiva ou angústia. Então imagine como você reagiria sem sofrer. Reconheça que não precisamos vivenciar a angústia, muito menos a raiva, ressentimento e hostilidade. A escolha é sua.

Vamos continuar com um exemplo. Alguém bate em seu carro. O que precisa ser feito? Pegue os dados do outro motorista, registre a ocorrência, contate o seguro, lide com todos os detalhes. Simplesmente faça isso e aceite. Aceite com satisfação, como uma maneira de fortalecer sua mente, desenvolver paciência e a armadura da tolerância. Não há como se tornar um Buda, permanecendo inseguro e vulnerável.

A paciência não surge de repente como um bônus após a iluminação total. Faz parte de todo o processo do despertar desenvolver maior tolerância e equanimidade diante da adversidade. Shantideva, no sexto capítulo de seu “Caminho do Bodisatva”, eloquentemente aponta que não há como desenvolver paciência sem encontrar a adversidade, e que a paciência é indispensável para nosso próprio crescimento no caminho para a iluminação.

B. Alan Wallace (EUA, 1950 ~)
“The Seven-Point Mind Training”

Paciência com ''inimigos''

Se não houvesse agressores ou causadores de danos, a paciência não surgiria. Ela aparece apenas na presença daqueles que nos atacam.

Assim, considerando que um inimigo é exatamente a causa absoluta para a prática da paciência, como é possível ser dito que um inimigo é um obstáculo para nosso mérito e virtude?

Não faz sentido, já que o primeiro fator causa o segundo. A ausência de inimigos é que impede o surgimento da paciência.

Kunzang Pelden

Compaixão Crucial:

Jigme Tromge Rinpoche (Índia, 1964 ~):

Cultivamos a compaixão na meditação ao nos colocarmos de fato no lugar dos seres que estão sofrendo. Para começar com um exemplo bastante ilustrativo, você pode imaginar a si mesmo como uma ovelha sendo arrastada pelo açougueiro em direção ao matadouro. É relativamente fácil entender a dor e o medo que o animal está passando ao sentir o cheiro do sangue dos outros animais abatidos e ao saber que ele está sendo conduzido para a própria morte.

Você poderá pensar: “Digamos que eu fosse uma ovelha que estivesse sendo desamparadamente arrastada em direção à própria morte, sem ninguém para me proteger ou me defender, com a porta do bardo se aproximando mais e mais à medida em que eu chego cada vez mais perto do matadouro. Como eu estaria me sentindo?”. Ao imaginar-se nessa posição, você ganha alguma empatia, alguma sensibilidade em relação ao sofrimento que aquele determinado ser está experienciando.

O valor de cultivar a compaixão na nossa meditação não deve ser subestimado. Um dos sutras afirma:

Se você deseja despertar para o estado búdico, não se preocupe com muitos Darmas; concentre-se em apenas um único Darma.

Que Darma é esse? A grande compaixão. Tudo se articula a partir dessa qualidade de compaixão. Essa é a medida do quanto ela é crucial para nossa prática.

“Mudança de perspectiva”





quarta-feira, 14 de agosto de 2013

OS PRAZOS DE VALIDADE




Tudo na vida tem prazo de validade.
Em alguns casos pode durar menos, outros mais, o fato é que chega o tempo em que a textura muda, o sabor termina, o doce azeda.
Se nem tudo vem com rótulo, cabe a nós discernirmos o tempo de cada coisa, interpretando os sinais de que, o que era bom, agora deixou de ser. Venceu.
O problema não é que as coisas estragam, mas a nossa incapacidade em perceber que o prazo venceu.
Profissões também vencem.
Se ao envelhecer, o sujeito continuar com as mesmas expectativas do tempo em que estudava, será um eterno estagiário.
É preciso realimentar as ambições, direcionando os passos a partir do último degrau galgado, não do primeiro.
Casais que esperam encontrar no passar dos anos exatamente os mesmos sentimentos dos primeiros dias, se decepcionarão.
A relação não ficou ruim, ela só mudou.
Tudo muda.
Saber disso, é andar consciente e, só para de caminhar, quem venceu todos os prazos.
Com o tempo, os prazos vencem, a vida muda de cor e o que fazia sentido perde o valor.
Mas é sempre assim.
Dê valor enquanto tem, entregue enquanto pode, mas, o dia em que o prazo vencer, não insista. Não lute contra ele.
Caminhe com gratidão, sabendo que deu seu melhor e que chegou onde deveria chegar, partindo em seguida para novos e melhores caminhos.
Depois dos prazos, novas contagens, novas estradas, novas possibilidades, renovação.
Para tudo há um prazo, cada coisa o seu tempo, o que começa , um dia acaba.
Sábios os que percebem.


Flávio Siqueira